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Pensar Enfermagem / v.27 n.01 / agosto 2023
DOI: 10.56732/pensarenf.v27i1.262
Artigo Original Quantitativo
Como citar este artigo: Cunha F, Pinto MR, Vieira M. Capacidade de autocuidado de pessoas idosas
portuguesas residentes em contexto domiciliário. Pensar Enf [Internet]. 2023 Ago; 27(1)76-81. Available
from: https://doi.org/10.56732/pensarenf.v27i1.262
Capacidade de autocuidado de pessoas idosas
portuguesas residentes em contexto domiciliário
Resumo
Introdução
Neste artigo apresenta-se uma análise da Capacidade de Autocuidado de pessoas idosas
residentes em contexto domiciliário, identificando variáveis que nela interferem. O
envelhecimento é uma etapa da vida em que as necessidades de saúde sofrem continuas
modificações decorrentes das situações de doença e do processo de envelhecimento, pelo
que a implementação de um adequado e eficaz apoio à capacidade para cuidar de si
contribuirá na promoção da saúde e bem-estar.
Objetivo
Identificar variáveis que interferem na Capacidade de Autocuidado de pessoas idosas
residentes em contexto domiciliário.
Métodos
Trata-se de um estudo de natureza não experimental, transversal, quantitativo de tipo
descritivo e correlacional, no qual participaram 400 pessoas que cumpriam os critérios de
inclusão definidos. Avaliação da capacidade de autocuidado com recurso à Exercise of Self-
Care Agency ESCA.
Resultados
Baseados na análise multivariada da variância, identificou-se a existência de diferenças
estatisticamente significativas em alguns domínios da Capacidade de Autocuidado de
acordo com a idade, escolaridade e autoperceção do estado de saúde da pessoa idosa. Em
termos globais, constataram-se correlações positivas entre a idade e o domínio Iniciativa e
responsabilidade (3.6%) e entre a escolaridade e o domínio do Conhecimento e procura
informação (5.2%) e correlação negativa entre a idade e o domínio Conhecimento e procura
de informação (3.7%). Identificou-se ainda que as pessoas idosas que se percecionam como
incapazes de cuidar de si apresentaram pontuações inferiores no domínio do Conhecimento
e procura de informação, comparativamente àquelas que se percecionam com capacidade
para cuidar de si, tanto quando se autopercecionam como saudáveis ou portadoras de
doença (diferença de pontuações médias de -.38 e -.53, respetivamente, p< .05).
Conclusão
Perante estes dados, e sendo o envelhecimento uma etapa de múltiplos desafios no
autocuidado, sugere-se que o enfermeiro equacione múltiplas estratégias para que a pessoa
idosa consiga aceder, compreender, interpretar e integrar o conteúdo da informação que
lhes permita cuidar de si.
Palavras-chave
Autocuidado; Cuidados de Enfermagem; Envelhecimento; Pessoa Idosa.
Fátima Cunha1
orcid.org/0000-0001-7847-7739
Maria Rosário Pinto2
orcid.org/0000-0001-6786-6069
Margarida Vieira3
orcid.org/0000-0002-9439-2804
1 Centro de Investigação em Qualidade de Vida
(CIEQV)| Centro de Investigação Interdisciplinar em
Saúde (CIIS); Escola Superior de Saúde - Instituto
Politécnico de Santarém, Santarém, Portugal.
2 Unidade de Investigação em Ciências da Saúde:
Enfermagem (UICISA-E) | Centro de Investigação,
Inovação e Desenvolvimento em Enfermagem de
Lisboa (CIDNUR), Escola Superior de Enfermagem
de Lisboa, Lisboa, Portugal.
3 Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde
(CIIS), Instituto Ciências da Saúde - Universidade
Católica Portuguesa, Porto, Portugal.
Autor de correspondência
Fátima Cunha
E-mail: fatima.cunha@essaude.ipsantarem.pt
Recebido: 16.02.2023
Aceite: 03.05.2023
Pensar Enfermagem / v.27 n.01 / agosto 2023 | 77
DOI: 10.56732/pensarenf.v27i1.262
Artigo Original Quantitativo
Introdução
No século XXI, a tendência para o envelhecimento
populacional é notória, sendo a longevidade uma das
maiores conquistas da humanidade.1 As Nações Unidas2
identificam os idosos como o grupo etário com maior
crescimento nos últimos 72 anos, representando 13,9% da
população global. O mesmo Organismo estima que a
população mundial com 60 anos ou mais deve duplicar até
2050 e mais do que triplicar até 2100, passando de 962
milhões em 2017 para 3,1 mil milhões em 2100. Em
Portugal, o índice de envelhecimento em 2020 situava-se
em 167%, sendo a percentagem de pessoas com mais de 65
anos a quarta mais alta da União Europeia.3
Nesta etapa de vida, as necessidades em saúde sofrem
contínuas modificações decorrentes do processo de
envelhecimento e/ou situações de doença, interferindo ou
podendo interferir na capacidade das pessoas idosas para
cuidarem de si, na sua capacidade de autocuidado, uma
potencialidade que é parte integrante do ser humano.
De acordo com a Teoria de Orem,4 o autocuidado está
associado ao desempenho ou à prática de atividades que os
indivíduos realizam em seu benefício para manter a vida, a
saúde e o bem-estar, ao potencial para se envolverem em
ações que visam cuidar de si, numa estreita relação a
autonomia da pessoa. Tal como a autora refere, no
autocuidado o foco é colocado no poder humano ativado e
evidenciado pela pessoa quando ela investiga, julga, toma
decisões e produz self-care operations.4 A forma como cada
pessoa desenvolve as atividades de autocuidado leva à
existência de níveis distintos de capacidade/défice de
autocuidado e, consequentemente, à capacidade de
desenvolvimento de comportamentos de promoção da
saúde e de um envelhecimento saudável.
Configura-se assim uma problemática que tem vindo a
ser objeto de estudo em diferentes realidades, com vários
estudos a evidenciarem associações estatisticamente
significativas entre a capacidade de autocuidado,
comportamentos de promoção de Saúde e bem-estar na
pessoa idosa.5,6,7,8 A relevância da dimensão do autocuidado
em contexto de saúde, ganha ainda destaque com o número
crescente de estudos que disponibilizam instrumentos para
avaliação da capacidade de autocuidado em pessoas
idosas,9,10 permitindo objetivar as suas necessidades
associadas à diversidade de eventos que ocorrem ao longo
de todo o curso da vida e não apenas um resultado direto
da idade cronológica,11 e contribuir para que sejam
desenvolvidas intervenções que respondam à
individualidade de vida da pessoa.
Neta linha de pensamento, o mais recente relatório mundial
sobre o envelhecimento e saúde apresenta um enfoque
social para a abordagem desta temática,11 destacando que a
idade avançada não implica dependência e que, embora na
sua maioria as pessoas idosas coexistam com múltiplas
comorbilidades, a diversidade das suas capacidades e
necessidades não é aleatória.
Da mesma forma, a Teoria do Défice do Autocuidado em
Enfermagem de Orem4 identifica fatores condicionantes
básicos que influenciam o autocuidado que transcendem a
idade (sexo, estado de desenvolvimento, padrão de vida,
fatores ambientais, disponibilidade e adequação de
recurso). No entanto, na evidência científica disponível,
identifica-se um número reduzido de estudos que relatam a
influência de variáveis como o género5,12 e a escolaridade.5
Emerge, assim, o interesse na análise das capacidades da
pessoa idosa para tomar conta de si, contribuindo para a
manutenção da sua saúde, identificando de que forma as
variáveis sociodemográficas interferem na capacidade de
autocuidado.
Considerando esta perspetiva, alinhada com a proposta de
recomendar um enfoque no envelhecimento da população
que potencie a transformação dos sistemas de saúde por
forma a substituir os modelos curativos pelos preventivos,
com foco nas necessidades das pessoas idosas,11 emerge
como essencial a identificação das variáveis que interferem
na capacidade de autocuidado das pessoas idosas por forma
a implementar um adequado e eficaz apoio ao
desenvolvimento destas capacidades.
Objetivo
Identificar variáveis que interferem na Capacidade de
Autocuidado de pessoas idosas residentes em contexto
domiciliário.
Métodos
Estudo de natureza não experimental, transversal,
quantitativo de tipo descritivo e correlacional, com parecer
favorável da Comissão de Ética da Administração Regional
de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo
(Proc.086/CES/INV/2018), desenvolvido assegurando as
dimensões éticas e legais subjacentes a estudos desta
natureza. Amostra constituída por 400 pessoas idosas
residentes em contexto domiciliário, recrutadas em centros
de dia (6 contextos) e consultas de enfermagem (6
Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados e 8
Unidades de Saúde Familiar), através de uma amostragem
por conveniência. Os dados foram recolhidos em formato
de papel e o investigador esteve presente ao longo do
processo para assegurar o cumprimento dos critérios de
amostragem, nomeadamente a capacidade cognitiva para
compreensão das questões, consentimento informado e
esclarecimento de linguagem incluída no questionário e/ou
leitura do mesmo, em participantes que o sabiam ler ou
tinham diminuição da acuidade visual. Para determinar a
autoperceção do estado de saúde, a pessoa idosa poderia
responder considerando três níveis: a) Incapaz de cuidar de
si, necessita ajuda outros; b) Capacidade para cuidar de si
apesar da doença e c) Saudável, com capacidade para cuidar
de si.
A avaliação da capacidade de autocuidado concretizou-se
através da aplicação da Exercise of Self-Care Agency ESCA
de Kearney e Fleischer,13 revista por Riesch e Hauck14 e
traduzida, adaptada culturalmente e validada para a
população portuguesa pelas autoras do presente artigo,
processo durante o qual se desenvolveu um estudo da
fiabilidade através da análise da consistência interna com
78 | Cunha, F.
Artigo Original Quantitativo
recurso ao coeficiente de Alpha de Cronbach e da validade de
constructo pela análise fatorial exploratória, numa amostra
de 625 pessoas idosas residentes em contexto domiciliário.
O instrumento resultante é constituído por 29 itens (menos
6 que a escala original), distribuídos por 4 domínios
conceptualmente congruentes com os autores originais e
com características psicométricas adequadas para sua
utilização em contexto clínico ou na investigação (escala
global α = .871; subescalas: Autoconceito α= .705,
Iniciativa e Responsabilidade α = .843, Conhecimento e
procura de informação α = .755 e Passividade α = .646).
Análise dos dados realizada com recurso ao programa da
IBM SPSS Statistics Base, na versão 27.0. A estatística
descritiva (medidas de tendência central e medidas de
dispersão) foi utilizada para caraterização da amostra. Para
a análise multivariada de variância, foram verificados os
pressupostos de independência das observações e
homogeneidade de variância/covariância. Utilizámos o
Traço de Pillai devido à sua robustez para violações modestas
à normalidade e o Lambda de Wilks sempre que se verificou
homogeneidade, aspetos que consideram as
recomendações de Marôco.15
Resultados
No que diz respeito às caraterísticas da amostra, ela foi
constituída maioritariamente por pessoas idosas do género
feminino (68.5%), com idades compreendidas entre os 65
e os 97 anos (M = 75.52 anos; DP = 7.16). Relativamente à
escolaridade, a maioria tinha o ensino primário (61.3%),
seguido dos que frequentaram ou concluíram o ensino
Secundário (27.3%). Com menor representatividade, os que
tinham habilitações de nível superior (7.2%) e os que nunca
frequentaram a escola (4.3%). A maioria das pessoas idosas
referiram percecionar-se com capacidade para realizar
atividades habituais de cuidar de si, apesar da doença (55%),
33.5% referiram percecionarem-se como saudáveis e
apenas 11.5% afirmaram uma autoperceção de
incapacidade para realizar atividades habituais de cuidar de
si, necessitando da ajuda de outrem.
Como resultados deste estudo, constatou-se que o nero
não interfere na Capacidade de Autocuidado, que os
dados da análise multivariada da variância o revelaram
diferenças estatisticamente significativas [Lambda de Wilks
= .988, F(4, 395) = 1.23, p = .297, ηp2 = .012, (1-β) = .386].
Os testes univariados também não identificaram qualquer
diferença estatisticamente significativa.
No que diz respeito à idade, a análise do Coeficiente de
correlação de Pearson, permitiu identificar uma correlação
positiva de baixa magnitude com a dimensão Iniciativa e
responsabilidade (r = .191, p< .01), e uma correlação
negativa, igualmente de baixa magnitude, entre a idade e o
Conhecimento e procura de informação (r = .193, p< .01)
(ver Tabela 1). Identificou-se ainda que, quanto maior é a
idade da pessoa idosa maior tende a ser a Iniciativa e
responsabilidade e menor o Conhecimento e procura de
informação.
Tabela 1 - Coeficientes de correlação de Pearson entre a idade dos participantes e as medidas ESCA
Idade dos participantes
Coeficiente de correlação de Pearson (r)
.036
.191**
-.005
-.193**
.031
* p < .05 **p < .01
Relativamente à influência do nível de escolaridade a análise
multivariada da variância, demonstrou influência do nível
de escolaridade na capacidade de autocuidado, que se
observou um efeito global estatisticamente significativo
[Traço de Pillai= .150, F(12, 1185)= 5.18, p< .001, ηp2= .050,
(1-β)> .999]. Este efeito deve-se à existência de diferenças
ao nível das dimensões Conhecimento e procura de
informação (magnitude correspondente a ηp2= 5.2%),
Autoconceito (ηp2= 2.6%) e Iniciativa e responsabilidade
(ηp2= 2.0%) (ver Tabela 2).
Pensar Enfermagem / v.27 n.01 / agosto 2023 | 79
DOI: 10.56732/pensarenf.v27i1.262
Artigo Original Quantitativo
Tabela 2 - Pontuações médias e desvios-padrão da ESCA em função da escolaridade dos participantes: Testes univariados (F),
magnitude do efeito experimental (ηp2) e poder da investigação (1-β)
Escolaridade
Não frequentou a
escola
(n= 17)
Ensino primário
(n= 245)
Ensino secundário
(n= 109)
Ensino superior
(n= 29)
Total
(N= 400)
M
DP
M
DP
M
DP
M
DP
M
DP
F
(3, 396)
ηp2
1-β
ESCA (global)
3.14
.56
3.20
.45
3.20
.50
3.12
.40
3.19
.46
Iniciativa e responsabilidade
3.50
.56
3.36
.56
3.25
.59
3.13
.51
3.32
.57
2.76*
.020
.666
Autoconceito
3.49
.65
3.63
.37
3.56
.42
3.41
.40
3.59
.40
3.46*
.026
.774
Conhecimento e procura de
informação
2.33
1.23
2.84
.89
3.14
.69
3.21
.49
2.93
.86
7.20**
.052
.983
Passividade (invertido)
2.58
.93
2.50
.81
2.58
.98
2.52
.71
2.52
.86
.25
.002
.098
* p < .05 **p < .01
A realização dos testes de Games-Howell indicou diferenças
estatisticamente significativas ao nível do Autoconceito,
exclusivamente nas pontuações médias entre as pessoas
idosas que possuem o Ensino Primário e os que detêm o
Ensino Superior (diferença de pontuações médias de .22,
p< .05). Ao nível do Conhecimento e procura de
informação, as diferenças estatisticamente significativas
situaram-se entre as pessoas idosas que não frequentaram a
escola ou possuem o Ensino Primário e as que detêm o
Ensino Superior (diferença de pontuações dias de .88 e
.36, respetivamente, p<.05), assim como, entre os
participantes com o Ensino Primário e o Ensino
Secundário (diferença de -.30, p< .01). Para além destes
aspetos, constatou-se que as pessoas idosas que não
frequentaram a escola apresentavam níveis baixos de
Conhecimento e procura de informação (M=2.33;
DP=1.23). Identificou-se ainda um aumento progressivo
dos valores obtidos com o aumento da escolaridade (ensino
primário M= 2.84; DP=.89; ensino Secundário M=3.14;
DP=0.69 e ensino superior M=3.21; DP=0.49) (ver tabela
2).
Relativamente à influencia da Autoperceção do estado de
saúde na Capacidade de Autocuidado, os resultados da
análise multivariada revelaram um efeito global
estatisticamente significativo, com uma magnitude para o
teste multivariado na ordem dos 6.5% [Traço de Pillai= .130,
F(8, 790)= 6.84, p< .001, ηp2= .065, (1-β)>.999].
A realização dos testes de Games-Howell permitiu identificar
maiores pontuações ao nível do Autoconceito em pessoas
idosas saudáveis, em comparação com os que se
percecionam como incapazes de cuidar de si (diferença de
pontuações médias de .25, p< .05). As pessoas idosas que
se percecionam como capazes de cuidar de si apesar da
doença apresentaram, também, maiores pontuações
comparativamente às que se percecionam como incapazes
de cuidar de si, necessitando de apoio de outros (diferença
de pontuações médias de .31, p< .01).
No referente ao fator Conhecimento e procura de
informação, as pessoas idosas cuja autoperceção é de
incapacidade para cuidar de si apresentaram pontuações
inferiores àquelas que se percecionam com capacidade para
cuidar de si apesar da doença e aos que se percecionam
como saudáveis (diferença de pontuações médias de -.38 e
-.53, respetivamente, p< .05).
Na dimensão Passividade (invertido), as pessoas idosas
autopercecionadas como saudáveis indicaram maior
atividade comparativamente às que se percecionam como
incapazes de cuidarem de si e àquelas que afirmaram
percecionar-se com capacidade para cuidar de si apesar da
doença (diferença de pontuações médias de .56 e .23,
respetivamente, p< .05) (ver tabela 3).
Tabela 3 - Pontuações médias e desvios-padrão da ESCA em função da variável Autoperceção do estado de saúde: Testes
univariados (F), magnitude do efeito experimental (ηp2) e poder da investigação (1-β)
Autoperceção do estado de saúde
Incapaz de cuidar de
si, necessita de ajuda
de outros
(n = 46)
Capacidade para cuidar
de si, apesar da doença
(n = 220)
Saudável, com
capacidade para
cuidar de si
(n = 134)
Total
(N = 400)
M
DP
M
DP
M
DP
M
DP
F
(2, 397)
ηp2
1-β
ESCA (global)
2.95
.44
3.21
.44
3.25
.49
3.19
.46
Iniciativa e responsabilidade
3.22
.59
3.35
.55
3.32
.60
3.32
.57
1.02
.005
.228
Autoconceito
3.34
.53
3.65
.34
3.58
.42
3.59
.40
11.63***
.055
.994
Conhecimento e procura de
informação
2.54
.88
2.92
.86
3.07
.80
2.93
.86
6.78**
.033
.918
Passividade (invertido)
2.16
.70
2.49
.85
2.71
.87
2.52
.86
8.00**
.039
.955
* p < .05 **p < .01
80 | Cunha, F.
Artigo Original Quantitativo
Discussão
Ao identificarmos variáveis que interferem na Capacidade
de Autocuidado de pessoas idosas residentes em contexto
domiciliário, constatamos não existirem diferenças
estatisticamente significativas ao nível do género, o que vai
de encontro aos resultados identificados em pessoas idosas
turcas5 e chinesas.12
Já em relação à idade, a Iniciativa e responsabilidade tende
a aumentar com o avançar desta, verificando-se o contrário
em relação ao Conhecimento e procura de informação.
Estes resultados poderão estar relacionados com a
intencionalidade atribuída pela pessoa idosa à procura de
informação, que para Orem4,16 a preocupação consigo
próprio, a motivação e a hierarquia de valores são aspetos
fundamentais para o envolvimento em ações de
autocuidado. Por outro, uma vez que a perceção, a
memória e as habilidades de aprendizagem são
consideradas disposições fundamentais para a ação de
autocuidado,16 as perdas de carácter biológico que se
tornam progressivas com o avançar da idade, poderão estar
na base de níveis mais baixos no domínio Conhecimento e
procura de informação em idades mais avançadas.
Identifica-se também uma influência do nível de
escolaridade nos domínios Autoconceito, Iniciativa e
responsabilidade, bem como, no domínio Conhecimento e
procura informação. Em termos globais, constatamos que
um aumento progressivo da escolarização se associa a um
aumento do nível de Conhecimento e procura de
informação. Estes resultados estão em linha com as
conclusões de outros estudos que revelam: uma baixa
escolaridade acompanha um conhecimento insuficiente
sobre a doença e tratamento12,17 e menor capacidade para o
envolvimento em ações de autocuidado.5
Apesar de ser importante mobilizar a dimensão de
desenvolvimento de competências ao longo da vida, na
verdade as pessoas idosas com baixa escolaridade podem
ter maior dificuldade em aceder a informação relacionada
com a sua saúde e com os cuidados de saúde, bem como,
menor capacidade para compreender e gerir informação
que lhes permita tomar decisões relacionadas com a sua
saúde. Apesar de uma vasta quantidade de informações
poder estar disponível para o público, proveniente de
diferentes formatos e fontes de informação, muitas pessoas
podem ter dificuldade em as interpretar e aplicar, o que
pode contribuir para uma maior complexidade ao colocar
boas práticas de saúde em curso, apesar da informação
disponibilizada.18 Outro fator que pode estar associado a
esta problemática é o baixo grau de literacia em saúde da
população idosa em Portugal, que pode condicionar a
capacidade de obter e aplicar informações relevantes sobre
saúde19,20,24 ou a gestão de situações de doença.20,21,24
Quando a esta situação se associa a autoperceção de
incapacidade para cuidar de si, verificamos a existência de
níveis mais baixos de autoconceito, o que poderá estar
relacionado com o impacto da dependência na identidade
da pessoa. Alguns autores afirmam que as situações de
doença em que há perda de controlo da pessoa, perante as
suas próprias rotinas, provocam alterações profundas no
autoconceito.22,23
Face a estes resultados, que assumem relevância na
compreensão de estratégias para o planeamento de
cuidados e que se alinham com as orientações do Modelo
de Orem4,16 e com a estrutura de raciocínio proposta pela
autora, sugere-se o desenvolvimento de intervenções que
permitam um acompanhamento que conduza à integração
da informação na forma como a pessoa cuida de si,
mobilizando, para tal, a orientação inerente ao sistema de
apoio e educação para o autocuidado proposto pela
autora.3,16
Conclusões
Como enfermeiros, devemos equacionar múltiplas
estratégias para que as pessoas consigam aceder,
compreender, interpretar e integrar o conteúdo da
informação que lhes permita cuidar de si, dado que, nas
pessoas mais idosas, com níveis mais baixos de escolaridade
e com a perceção de serem incapazes de cuidar de si, foram
encontradas ponderações mais baixas no domínio do
Conhecimento e procura de informação.
Na vivência de situações de incapacidade, a promoção do
autoconceito surge também como uma das dimensões
relevantes para a capacidade de autocuidado pelo que esta
deve ser uma dimensão a integrar no planeamento dos
cuidados.
Considerando que este estudo apenas integra pessoas
idosas em contexto domiciliário, sugerem-se novos estudos
incluindo contextos de internamento em diferentes
tipologias. Uma análise de outras variáveis que tenham por
base os fatores condicionantes básicos enunciados por
Dorothea Orem4 na sua Teoria do Défice do Autocuidado
em Enfermagem contribuiriam para uma compreensão
mais alargada da problemática.
Contribuições autorais
FC: Conceção e desenho do estudo; Recolha de dados;
Análise e interpretação dos dados; Análise estatística;
Redação do manuscrito.
MRP: Colaboração na análise estatística; Redação do
manuscrito.
MV: Conceção e desenho do estudo; Análise e
interpretação dos dados.
Conflito de interesses
As autoras declaram que não há conflito de interesses.
Financiamento
Financiamento: Trabalho de tradução para língua inglesa
financiado por fundos nacionais através da FCT
Fundação para a Ciência e Tecnologia, I.P., no âmbito do
projeto nº UID/CED/04748/2020 (CIEQV).
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Artigo Original Quantitativo
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